
Qual o sentido da vida?
Diversos pensadores já arriscaram, mas será que existe resposta?
Já ouvi que todo mundo, em algum momento, vai se fazer essa pergunta sobre o sentido da vida. Eu já me fiz e, de vez em quando, faço novamente.
Apesar de ser uma pergunta pertinente ao Setembro Amarelo, acredito que não se restrinja aos momentos escuros ou aos transtornos mentais. Como seres humanos, simplesmente temos a capacidade de pensar sobre ela. Aí, cedo ou tarde, pensamos.
Também se fizeram essa indagação diversos pensadores ao longo da história. E a razão é fácil de compreender: se a vida tiver sentido, teremos mais vontade de vivê-la. Ou, como afirmou Nietzsche:
Quem tem um porquê enfrenta quase qualquer como.
Friedrich Nietzsche
No fim, não importa os passos a serem dados, nos caminhos mais tortuosos possíveis. Se acreditamos estar indo a algum lugar importante, continuamos.
O sentido do sofrimento
Encontrei essa frase de Nietzsche no livro “Em busca de sentido”, de Viktor Frankl. Neuropsiquiatra e de família judaica, ele nos conta sobre sua passagem em campos de concentração e o que neles aprendeu sobre o sentido da vida.
Observando os companheiros com seu olhar médico, percebeu que alguns simplesmente sucumbiam ao desespero. Outros, vivendo a dor com bravura, tornavam-se pessoas melhores. Isso porque encontravam sentido no próprio sofrimento.
Sim, segundo essa perspectiva, a vida não teria sentido apenas quando é feliz, mas também o sofrimento seria carregado de significado. Isso me lembra o apóstolo Paulo. Em sua carta aos romanos, ele incentiva os cristãos a serem “sacrifícios vivos”.
Sendo ou não religioso, você não concorda com essa ideia? As grandes provações não são encontradas apenas nas histórias dos mártires, que no sacrifício da morte imprimiram seus ideais. Mas, também, viver é sacrifício.
Frankl, criador da logoterapia, conclui que no sofrimento, pessoas são capazes de “vencer interiormente”, mas não respondendo à pergunta “o que a vida tem para mim?”, mas sim “o que a vida espera de mim?”.
Aquilo que só você pode fazer
A vida seria, assim, uma tarefa a ser cumprida. E tem tarefas que só a sua singularidade pode dar conta. Aqui, cabe desmentir a máxima “ninguém é insubstituível”, tão reverberada no mercado de trabalho.
Muitas pessoas são capazes de realizar as mesmas tarefas. Mas só você, como ser humano único e singular que é, pode realizá-las com sua essência. Pessoas podem aprender com você e, ainda assim, farão do jeito delas. Nunca serão como você.
Acho que esse seria um bom complemento para a famosa frase:
O que quer que você faça na sua vida será insignificante, mas é muito importante que você faça, porque ninguém mais o fará!
Mahatma Gandhi
Ninguém o fará como você.
E, por mais que quase todo o nosso valor seja associado ao trabalho, vai muito além disso. É a sua forma particular de existir e se relacionar no dia a dia.
Talvez você seja capaz de trazer leveza a conversas de forma única. Todo mundo pode ter compaixão, mas talvez sua voz transmita essa compaixão de um jeito especial.
Para as suas palavras, toques, sorrisos e lágrimas, não existem cópias perfeitas.
A vida tem sentido quando há um propósito
Tem a ver com a ideia de propósito. A vida pode realmente não ter sentido quando é superficial, quando se passa por ela sem a intenção de deixar nada importante de si mesmo.
Mas, quando você tem um propósito, ele te faz levantar todos os dias, mesmo quando falta motivação, foco, disciplina, vontade… alegria. Mesmo quando há sofrimento.
Para mim, esse porquê encontra eco na nossa necessidade de nos relacionarmos. Somos e nos reconhecemos a partir do encontro com o outro. Por isso, o propósito terá mais força quando abraçar a importância de apoiar, ajudar, acolher.
Não apenas nossos amigos, mas as pessoas desconhecidas que, talvez, também estejam precisando encontrar o sentido da vida. E às vezes, uma palavra de apoio traz mais respostas que qualquer literatura científica.
Concordo com o professor e filósofo Mario Sérgio Cortella que, em uma de suas brilhantes palestras, afirmou que o sentido da vida é cuidar da vida. Seja da nossa vida ou da vida dos outros.
Afinal, para ajudarmos os outros, precisamos estar inteiros. Precisamos ser ajudados, por nós e por pessoas que já entenderam o real significado da compaixão e da empatia.
E é importante lembrar que cuidar da própria vida pode ser proporcionar a nós mesmos não apenas nossos desejos, mas o que precisamos. Por exemplo, por mais que você queira passar o fim de semana inteiro sozinho, isso pode ser diferente da sua real necessidade no momento.
A solidão, de vez em quando, é necessária. Mas, quando ela se torna a regra, não há espaço para encontrar o sentido da vida.
Essa ideia do sentido que se constrói em conjunto com o outro combina com a minha resposta particular sobre essa pergunta tão difícil de se responder. Afinal, que sentido a vida tem?
O que penso sobre o sentido da vida
Como já disse, foram muitos os pensadores a elaborar possíveis respostas. Mas, para mim, quem deu a melhor resposta foi a minha avó.
Dona Maria Galvão não escreveu nenhum livro, não era filósofa, médica, neurocientista. Nem mesmo tinha graduação. Mas, frequentemente, na simplicidade encontramos os aspectos mais profundos de nós mesmos. E de simplicidade ela entendia bem.
Aos 53 anos, em seus últimos dias de vida, as dores e a confusão mental provocadas por uma doença cruel não deixavam dúvidas. Ela podia sentir o fim se aproximando.
Aí, num dia comum, sem necessidade de nenhuma introdução ao tema, tomada pela percepção de que a vida vale muito para dar lugar a rodeios, ela disse:
“Não tenho medo de morrer. Só não quero me separar de todo mundo.”
O que a assustava não era o esvaziar do fôlego da vida. Ou mesmo as realizações que não couberam em seus anos. Seu maior tormento era, na verdade, abandonar aqueles a quem amava.
Seu medo de morrer vinha da ideia da falta. De seus filhos, netos, irmãos, amigos. Mesmo considerando sua crença de que, após fechar os olhos para este mundo, a própria saudade já lhe escaparia. Não seria capaz de sentir falta de nós.
Mesmo em meio ao sofrimento trazido pelos efeitos da quimioterapia, as longas estadias em camas de hospitais, as quedas inevitáveis quando as pernas não respondiam, ela preferia não se entregar ao descanso da morte.
Por medo de nos deixar. Porque o propósito de sua vida, até ali, tinha sido seguir sua espiritualidade e cuidar daqueles que amava.
Mas acredito que esse medo, até pelo fato de ser irracional, nos dá pistas sobre o sentido da vida. Não pelo medo em si, mas por aquilo a que ele está conectado – o amor.
Minha avó nos amava e tinha medo de se separar de nós, mesmo sabendo que, na morte, não poderia sofrer a nossa ausência.
Esse amor, do qual somos tão conscientes e, ao mesmo tempo, ignora verdades racionais como essa, talvez seja a resposta justamente por sua força.
Essa força que nos faz ter medo de perder o que sabemos, com certeza, que realmente faz sentido, verdadeiramente diz algo sobre nossa essência: nossos sentimentos uns pelos outros.
Aí, a despeito de todas as divagações dos estudiosos, e apesar de conhecer e até mesmo me guiar por respostas científicas ou religiosas, aprendi sobre o sentido da vida com a dona Maria Galvão.
O sentido da vida é o amor.
Por mais que às vezes acorde sentindo a escuridão me tomar por dentro. Sinta tanto cansaço pelos sofrimentos inerentes à vida. Tenha ouvido e continue ouvindo tantas palavras de ódio. Ainda me lembro de viver por aqueles que amo. E também aqueles que ainda vou amar.
Pela família que me foi dada e a família que mais tarde escolhi. Pelos amigos que trazem calor às memórias e os que ainda vou conhecer. Por todos eles, vale a pena viver. E até sofer.
E se, lendo isso, você concluir que não há amor em sua vida – recebido ou doado –, talvez essa busca deva ocupar o lugar dos pensamentos negacionistas sobre o sentido da vida.
Porque, seja quem você for, onde estiver, uma das prováveis e maiores verdades sobre você mesmo é sua capacidade de amar.
E oportunidades para amar surgirão nas próximas esquinas. Esses mesmos amores, possivelmente, nos deixarão. Seja pela morte ou pelos desencontros naturais.
Mas a conexão já terá te transformado, permanecerá com você. Como as palavras da minha avó continuam ressoando em minha mente.
E, logo, novos amores virão nas próximas esquinas. Mas para encontrá-los, precisamos caminhar até lá.